Cadê a crise que estava aqui?

Mesmo contrariando o “juízo de valor” de algumas “otoridades” maledicentes, devo confessar minha crença inabalável na importância da imprensa, como mecanismo de propagação de idéias, fatos documentados, informações, noticias. Entendo como indissociáveis, a liberdade dos indivíduos e da mídia, porque negar sua importante função, seria admitir e aceitar passivamente a alienação absoluta.

Por isso, acredito não serem meras “noticias infundadas”, dados divulgados na ultima semana, retratando elevados índices alcançados pela bolsa de valores, próximos daqueles verificados na pré-crise e, a queda sensível na cotação do dólar. Acredito, mas não os reconheço como noticias auspiciosas no contexto atual.

Justifico: remontando às causas determinantes da crise que atingiu em cheio, os mercados financeiros e de valores mobiliários ao redor do mundo, provocando serias conseqüências para a economia real, vamos encontrar exatamente, os efeitos danosos da desenfreada especulação nesses mercados, fruto de descompassos sensíveis, entre o desempenho da economia real retratado no PIB e outros indicadores macroeconômicos e, os níveis exuberantes alcançados pelas bolsas. Já vimos este filme.

A economia real, ou seja, aquele mundo físico econômico em que vivemos, ainda apresenta graves sintomas do desgaste decorrente da crise: queda continuada na produção industrial, retração no nível de emprego e renda, declínio na arrecadação tributaria, resultados negativos nas contas externas e internas, e outras tantas consequencias negativas, que ainda sequer permitiram uma mensuração adequada e segura, dos desdobramentos e efeitos.

A visualização superficial e isolada do desempenho da bolsa e retomada da valorização preocupante do real, configuram um cenário irreal da economia, a ponto de caber perguntar: “Cadê a crise que estava aqui?”. Ela continua espraiando seus efeitos negativos, a varios setores de atividades e indicadores de desempenho da economia.

Por que isto ocorre? Em síntese, pode-se resumir as razões: os mercados financeiros e de valores mobiliários são extremamente mais ágeis e dinâmicos, quando comparados aos segmentos de atividades da economia real e, produzem respostas rápidas, que podem ser impulsionadas por exemplo, por uma especulação bem coordenada; estes mercados, como bem podemos relembrar, foram altamente beneficiados e privilegiados com “ajudas generosas” de toda ordem dos governos – consequentemente, puderam absorver impactos negativos da crise, “socializando custos e prejuízos”. Ao contrario, a economia real ainda nem pode contabilizar adequadamente a sua “privatização de prejuízos” e, depende de tempo suficiente e condições favoráveis para retomar ritmos de atividade pré-crise.

É preocupante que, as tão propaladas “medidas de regulação”, que deveriam ser adotadas para conter e minimizar efeitos especulativos desregrados nesses mercados, ate então, limitaram-se a generosas injeções de recursos públicos, benefícios fiscais e outras concessões paliativas anti-ciclicas. O que na pratica, robusteceu em curto prazo, a capacidade manipuladora dos especuladores, os quais, dão sinais inegáveis, de retomada de suas ações, com vigor invejável.

Não se trata pois, de uma “retomada saudável e confiável” dos níveis de desempenho favoráveis no ambiente pré-crise; ao contrario, a economia real, continua envidando esforços para superar a débâcle, enquanto estes setores, voltam a ser dominados perigosamente pelos mesmos “trapalhões” que provocaram a “zorra total...”.

O risco presumível: retardar e elevar custos da recuperação e ocorrencia de novas crises pontuais, certamente de menor intensidade, mas nem por isso, menos causticantes para a economia real. O governo limita-se a garimpar aqui e ali, algum indicador eleitoral positivo e, exclamar: “Tô pagando...” (isto é , o povo). – Paulo Mendes – Economista.

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