O DESABAFO CENTENARIO

Ao visitar minha avo, após um de seus últimos aniversários, minha mãe perguntou:
- Mamãe, como passou seu aniversario?
Ao que ela respondeu:
- Todos em paz e com saúde, minha filha.
Inconformada com a resposta, comentou:
- Mas mamãe, isso é maneira de comemorar um aniversario? Não teve uma festinha, presentes, bolo, convidados e tudo mais?
Minha avo respondeu:
- Filha, quando chegar à minha idade, você vai compreender que, estar em paz e com saúde, é o mais importante na vida!

Quanto todos nos gostaríamos que, ao completar seu centenário, Itabuna estivesse em perfeita paz e, bastante saudável? Nem estaríamos nos importando com festas, shows, inaugurações e outros eventos que, certamente, marcarão a data, de forma a enaltecer a efeméride e disfarçar momentaneamente, os graves problemas do cotidiano.
Em verdade, aos cem anos de emancipação política, a cidade ainda padece de segurança publica desejável, saneamento e saúde publica mais eficiente, a violência grassa incontrolável, e outros tantos problemas de ordem social e econômica, que entravam seu desenvolvimento.
Certamente, nomes de heróicos desbravadores e empreendedores, que a construíram e fizeram crescer, serão lembrados e exaltados, em pronunciamentos e homenagens pontuais, que sempre nestas oportunidades, pecam pelo esquecimento de alguém ou alguns, indispensáveis. Antevejo seus atuais administradores, citando realizações, números e estatísticas encomendadas para a ocasião, como se encomendam brigadeiros e pasteis, para um aniversario de crianças. E a enumeração de “obras” que prometem realizar no futuro, nos trará a sensação de que caminhamos para a “terra prometida”.
A proximidade do centenário, nos períodos recentes, já foi marcada pela virtualidade de obras prometidas de longas datas, a exemplo, duplicação da estrada Itabuna-Ilheus e do trecho de acesso de Ferradas a Itabuna; construção da barragem do Rio Colônia; pólo industrial oriundo do gasoduto; cobertura do Canal do Lava Pés; integração de Itabuna ao Projeto Porto Sul; PAC do cacau, e outras tantas proposições, que desfilaram nos discursos das ultimas campanhas e visitas de mandatários, ministros, secretários, federais e estaduais. De concreto, efetivo, as promessas eivadas de cinismo desfaçatez e falta de comprometimento, nos legaram tão somente, um vazio de realizações, que estão a converter o jubilo pelo nosso centenário, numa sensação de abandono politico.
Já imaginaram se uma pequena parte ao menos, de toda essa parafernália de empreendimentos, estivesse disponível e operante, em tempo hábil? Mas na pratica, tudo não passou ate então de “sonhos”, que ate poderão estar concretizados, no próximo centenário... quem viver, verá, ou não verá tão cedo.
No recente lançamento do projeto de cobertura do canal na Amélia Amado, evento explorado por políticos dos mais diversos matizes, não faltaram aproveitadores de ocasião, a exibir faixas pela cidade, agradecendo ao Presidente Lula, pela “obra”... Beira ao ridículo, e seria o caso de perguntar: “Qual obra”?, se de concreto, apenas umas tantas arvores foram derrubadas? Em tempos de campanha política, ate lançamento de pedras fundamentais, passam a ser computadas como “obras” prontas e acabadas, num desrespeito ao povo e inadimplência em relação a promessas de campanha.
Não seria gratificante, se ao menos, estivessem já concluídas, obras do novo Fórum, um aterro sanitário decente, uma nova Estação Rodoviária, o Teatro e o Centro de Convenções - hoje, convertidos em monumentos à desídia, ao descaso, desperdício e inoperância? Se não tiveram competência suficiente para atrair novas industrias, por que não evitaram o inexplicável fechamento de uma industria de calçados, que desempregou tantos itabunenses, deixando suas famílias e empregos indiretos, em situação perversa?
Poderia estar dedicando estas mal traçadas linhas, a enaltecer fatos históricos, realizações marcantes deste primeiro século. Formulando idéias, ou sugerindo propostas de realizações. Seria talvez mais agradável e simpático. Mas, optei por um grito de alerta, um chamamento à razão: “Itabuna e seu povo, são muito maiores do que as mesquinharias políticas, e competição por interesses personalistas, que entravam e obstruem suas reais potencialidades”. Em resumo, sofremos um problema de gestão mais operante e ousada, e a falta de políticas publicas, operadas por políticos de melhor cepa, marcada pelos interesses personalistas. Itabuna, que já teve uma base política atuante e dinâmica, parece ter-se convertido, em mera “depositaria de votos”, manipulados a cada eleição, ao bel prazer de interesses que não coadunam com suas reais necessidades.
Creio que esta terra, já proporcionou demonstração de sua capacidade de superar adversidades. Seu povo e seus empresários, apesar da falta de sensibilidade e desapreço de governantes nas esferas local, estadual e federal, estão gradativamente, à custa de muitos sacrifícios, superando as mazelas da mais grave crise que abalou a economia cacaueira – potencializada, exatamente pela falta de forças e vontades politicas.
Nos últimos anos, a economia itabunense, vem se reerguendo, divisando novos horizontes e diversificando atividades. São exemplos patentes desse esforço, a ampliação do pólo educacional, inovações no setor de saúde, e na área comercial, a implantação de um shopping center, trouxe nova dinâmica ao segmento varejista – este, o grande salto empreendedor em dez anos.
Na construção civil, pontuam centenas de novas unidades, já concluídas ou em fase de edificação. O comercio, vê-se marcado por nova dinâmica, com atração de empreendimentos atacadistas, que embora burocraticamente sediados no vizinho Município de Ilhéus, tem suas áreas operacionais, na periferia de Itabuna. A recente inauguração de um grande estabelecimento, edificado e tornado operacional em poucos dias, representa um desafio e exemplo, de quanto a iniciativa privada é capaz de realizar, em contraponto à inércia e inoperância de gestores públicos, mais afeitos a promessas longínquas e planos embolorados.
A ousadia, a persistência, de empreendedores, que investem, confiam e apostam no presente e futuro de Itabuna, contrastam com a lugubridade de um aeroporto desativado, com a falta d’água em nossas torneiras, com esgotos despejados no Cachoeira, com um transito caótico, por falta de investimentos em novas artérias, com a falta de segurança das pessoas em logradouros públicos e suas casas, com os desserviços à saúde publica, e outras mazelas, decorrentes de disputas políticas mesquinhas.
Consta nas “programações do centenário”, que erguerão um monumento a personalidades marcantes da nossa historia. É mais que justo e merecido, lembrar e homenagear nossos heróicos pioneiros. Mas, paralelamente, deveriam também descerrar uma placa, nos esqueletos abandonados do Centro de Convenções e do Teatro, em protesto contra a estupidez e o descaso, de gestores públicos, que agridem nossa consciência, nossa cidadania, para que no limiar do novo século, não se repitam orgias e desperdícios tais, com recursos públicos.Itabuna, sem duvidas, orgulha-se do seu povo lutador. O centenário, nos traz reminiscências de momentos e feitos memoráveis, que justificam uma comemoração. Mas, é também o momento para repensar e refletir sobre o presente e futuro da cidade. Não podemos perder esta oportunidade de congraçamento, de sonhos a realizar, de vislumbre de um novo século mais profícuo e venturoso, de união em torno dos interesses da nossa coletividade, sem cobrar nova postura de nossos governantes e políticos, para que, no futuro que se avizinha, possamos gozar da saúde que reivindicamos, em paz com nossas famílias, e não se repitam ilusórias e vãs promessas. O melhor presente a Itabuna em seu centenário, seria o compromisso de trata-la com mais seriedade, honestidade e competência.

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